Apresentação
Nos últimos 5 anos aumentou significativamente o interesse por
start-ups, scale-ups e empresas investidas por Venture Capital (VC)
no Brasil, o que chamou a atenção também dos fundos de Private
Equity (PE), normalmente acostumados a investir em empresas mais
maduras, geradoras de caixa, mas que nos últimos anos, em busca de
maiores retornos, passaram a investir também em empresas do tipo.
Este estudo descortina o interessante fenômeno da interação, cada
vez maior, de dois segmentos distintos e anteriormente afastados do
mercado de capitais privados brasileiro. Revelamos quais os
gestores de PE e de VC estão por trás desse movimento, em quais
setores essa interação tem sido observada e que tipo de companhia
e, em qual momento de sua trajetória, tem atraído os fundos de PE. O
estudo conclui analisando o impacto no desempenho dos fundos que
investiram nessas empresas.
Esperamos com isso trazer mais luz à oportunidade de negócios
entre fundos de PE e de VC, fenômeno que tem contribuído para
fechar o gap que existia até recentemente no mercado de capitais,
gerando mais liquidez para os fundos de VC, ampliando a
possibilidade de retornos significativos para os fundos de PE,
oferecendo às empresas inovadoras fontes de capital para todo seu
processo de desenvolvimento (desde a criação até uma eventual
internacionalização, passando pelo IPO), e, em última instância,
facilitando a jornada das start-ups até se tornarem grandes negócios.
Fechando o abismo
Por muitos anos no Brasil havia um abismo entre dois segmentos do
mercado de capitais privados. De um lado fundos de Venture Capital
(VC) apoiando start-ups com elevados desafios tecnológicos e
comerciais. De outro, fundos de Private Equity (ex. buyout e
mid-market) financiando companhias de grande e médio porte, em
geral familiares, spin-offs de multinacionais ou oriundas de
privatização, já lucrativas e/ou geradoras de caixa.
Esses dois mundos coexistem com estratégias, perfis e percepção
de valor bastante distintos. Venture capitalists buscam start-ups
com crescimento explosivo e topam conviver com prejuízos anuais e
fluxos de caixa negativos. Miram no longuíssimo prazo e, na hora de
investir, se deparam com realidades de avaliação de negócios mais
desafiadoras e mais subjetivas, que acabam tendo por referência
múltiplos de receita, valor por usuário etc.
Por sua vez, gestores de Private Equity (PE) que atuam em buyout e
mid-market buscam empresas com fluxo de caixa positivo, que
crescem mais rápido que a economia, mas de forma mais previsível.
As negociações desses fundos com as empresas acabam girando
em torno de múltiplos da geração de caixa (EV/EBITDA), de lucro
(P/L) ou em alguns casos de patrimônio líquido (P/B), por exemplo
em negócios florestais.
Isso aliado a enormes diferenças de tamanho de cheques que fundos
de PE e VC estavam acostumados a assinar, faziam com que
raramente um fundo de PE demonstrasse interesse por empresas no
portfólio de fundos de VC. Não restava ao venture capitalist outra
alternativa senão esperar diversos anos até que suas empresas
investidas pudessem atrair a atenção de um comprador estratégico
ou atingir o tamanho certo para um IPO – listagem inicial em bolsa de
valores (o que raramente se via no Brasil). O tempo extra para o
sucesso de uma saída acabava prejudicando o próprio desempenho
desses fundos, o que também tornava difícil a atração de
investidores para essa classe de ativos.
Esse cenário começa a mudar no Brasil a partir de 2010, quando dois
movimentos ocorreram simultaneamente. Fundos de VC com mais
recursos captados passaram a fazer investimentos maiores, que
permitiam acelerar e acompanhar as start-ups ao longo de sua fase
de rápido crescimento, financiando rodadas de série B, C ou D.
Algumas dessas rodadas valorizavam as companhias investidas em
mais de US$1 bilhão, forjando assim os “unicórnios” nacionais,
como 99, Nubank, Movile, iFood e outras.
Bolsas de valores também passaram a receber bem esse tipo de
companhia. De início essas listagens ocorreram na Nasdaq (ex.
PagSeguro, Stone) e depois na B3 (ex. Enjoei, Méliuz, GetNinjas).
Enquanto isso, grandes grupos de Private Equity começaram a
buscar por oportunidades de maior retorno, o chamado growth
equity. Passaram assim a mirar empresas inovadoras, que trazem
soluções digitais escaláveis e, em alguns casos, com possibilidade
de alcance global (ex. QuintoAndar e Gympass).
Com isso, dois tipos de investidores, originalmente com perfil e
forma de enxergar o mundo um tanto quanto diferente, começaram
a fazer negócios entre si e conjuntamente, fechando o abismo e
multiplicando as oportunidades de negócios no setor.
A década da integração
O Gráfico 1 abaixo mostra o volume e o valor de transações
realizadas por fundos de PE (inclusive os de growth equity) em
companhias investidas por VC, ao longo dos anos no Brasil. Até 2010
esse tipo de transação ocorria casualmente, sendo que o primeiro
caso registrado foi da CSU Cardsystem em 1997 quando a Advent
International realizou investimento. A saída se deu por meio de IPO
na bolsa de valores (B3) em 2006.
Entre 2011 e 2013 foram realizadas cerca de 3 transações por ano
com uma média anual de R$245 milhões. Isso aumentou para 4
transações por ano no período de 2014-2016, quando o investimento
anual saltou para R$540 milhões. Essa atividade acelerou
significativamente em 2017 e 2018 com 16 negócios e quase R$2,5
bilhões investidos. Ou seja, uma média de 8 transações e R$1,25
bilhões por ano. Nível semelhante ao observado em 2019 e 2020
com 10 e 8 transações por ano, respectivamente. No total este
período testemunhou 57 transações envolvendo 48 companhias e
R$6,6 bilhões de investimento.
Participantes
Trinta e três gestoras de PE estiveram envolvidas na ponta
investidora dessas transações. O Gráfico 2 a seguir apresenta as 10
gestoras mais ativas, com o valor e número de empresas investidas.
Juntas, investiram R$5,5 bilhões (82% do total) em 22 empresas
(46% do total).
Em termos de valor, Goldman Sachs & Co. se destaca em primeiro
lugar com a compra da Oncoclínicas, companhia que contou
inicialmente com investimento do fundo de VC da FIR Capital
Partners: Fundotec II. Já em termos de número de empresas, se
destacam Riverwood, Temasek e General Atlantic. Todas com equipe
dedicada ao Brasil e escritórios no país.
Riverwood é uma firma de private equity focada em empresas de
base tecnológica de alto crescimento. Tem equipe no Brasil liderada
por Joaquim Lima, que atuou como investment officer no IFC, onde
foi responsável por growth capital em tecnologia, media e
telecomunicações (TMT).
Temasek é um dos fundos soberanos de Singapura. Diferentemente
de sua organização irmã, o GIC, realiza investimentos de maior risco em áreas como TMT, em busca de companhias em ponto de inflexão.
É liderada no Brasil por Matheus Villares, oriundo dos bancos Citi e
Goldman Sachs & Co.
General Atlantic é um fundo global de growth equity focado em cinco
setores: consumo, serviços financeiros, saúde, ciências da vida e
tecnologia. Sua unidade no Brasil é liderada por Martin Escobari,
oriundo da firma de private equity Advent International. Martin
acumulou experiência no mundo de Internet, quando atuou como
CFO do e-commerce Submarino.com.
Outras firmas que se destacaram nesse tipo de transação foram:
Actis e Warburg Pincus. Embora Actis tenha realizado apenas um
investimento em companhia oriunda de VC, o valor aportado na
empresa Stone Pagamentos foi relevante. A companhia agora está
listada na Nasdaq. Já a Warburg Pincus é uma gestora focada em
growth capital. Realizou aportes em empresas de diversos setores e
estágios de crescimento no Brasil, tendo como exemplos Camil e
Petz que tiveram saída por meio de IPO.
O gráfico 3 indica os principais fundos de VC que estavam por trás
das cias. que receberam investimentos dos fundos de PE.
Monashees e Kaszek Ventures estiveram envolvidas com a maioria
dessas empresas, que também receberam o maior valor de
investimento. Ambas investiram por exemplo na MadeiraMadeira que
posteriormente atraiu Dynamo e Softbank.
Softbank é o maior fundo de VC do mundo e, por isso, faz parte de
uma categoria própria no ecossistema de tecnologia. O mega fundo
se envolveu em oito transações, mas, como no exemplo acima,
sempre co-investindo com fundos de PE.
Setores
Os Gráficos 4 e 5, a seguir, apresentam a distribuição do volume
financeiro alocado em cada setor e o número de empresas que
receberam esses investimentos. O setor de saúde (healthcare,
somado aos de healthtech e sportech se destaca com pouco mais de
31% do capital investido e quase 17% do número de empresas. Isso
devido, principalmente, à compra da Oncoclínicas pela Goldman
Sachs & Co. em 2018. A transação totalizou dois terços do valor
investido nesses segmentos. A representatividade desses setores
seria ainda maior caso se considerasse o valor investido por
Temasek nas Clínicas SiM, o que, no entanto, não pôde ser verificado
ou estimado.
As fintechs ocupam a segunda posição, com destaque para a Stone
Pagamentos, Neon Pagamentos e Technisys. Somaram quase 17%
do valor investido e 12,5% do número de empresas. Esse é um
segmento que também tem atraído compradores estratégicos. Por
exemplo, Locaweb e Méliuz compraram recentemente dos fundos de
VC as cias. Vindi e Grupo Acesso.
O setor de Varejo, representado por E-commerce, Marketplaces e
RetailTech aparece em terceiro lugar com 11,3% do valor investido e
16,6% do número de empresas, sendo a Enjoei um dos casos mais
recentes, que, dois anos após a entrada do investidor de PE, realizou
IPO, tendo captado R$1,1 bilhão em oferta primária e secundária.
Apesar de agregar valor investido menos relevante, o setor com
maior número de empresas investidas pelos fundos de PE foi o de
tecnologia. O setor somou 10,2% do valor e 16,7% do número de
empresas. O Gráfico 6 apresenta as principais tecnologias que essas
empresas desenvolvem. Destaque para Cybersecurity, Big Data e
soluções de ERP, que, juntas, somaram 86% do valor. Trata-se de
tecnologias aplicáveis a diversos setores.
Independentemente do setor, o que os gestores de PE buscam
nesse tipo de investimento é a capacidade de crescimento do
negócio e, consequentemente, de geração de retorno sobre o investimento. Assim, o chamado growth capital é atraído por setores e
tecnologias com potencial de ganhar fatias de grandes mercados ou
com possibilidade de aplicação em mercados que, juntos, possuem
tamanho relevante.
Companhias alvo
A aplicação da tese de growth capital fica evidente ao se analisar o
desempenho financeiro de cias. investidas por VC em torno da data
do aporte de capital feito pelos fundos de PE. Embora empresas
financiadas por VC tenham inicialmente fluxo de caixa e lucro
operacional negativos, a maioria das cias. analisadas obteve lucro
operacional nos anos próximos ao do investimento de PE, mantendo
subsequentemente o forte crescimento de receita.
A Tabela 1 apresenta uma amostra de 14 companhias para as quais
foi possível analisar os dados financeiros do ano do investimento de
PE e anos adjacentes. Dessas, 11 (78%) apresentaram lucros
operacionais positivos nos períodos próximos ao da transação,
somando 94% do capital investido por PE. Ou seja, são companhias
em um estágio de amadurecimento que aliam elevado potencial de
retorno com menor risco financeiro e maior previsibilidade, pois já
tinham uma operação lucrativa ou estavam próximas de alcançá-la.
Das empresas analisadas, a única que não tinha lucro operacional
positivo mas que atingiu essa marca no ano subsequente ao do
recebimento de PE foi a Stone Pagamentos. A empresa recebeu R$
410 milhões de investimento em 2016 e, já em 2017 apresentou lucro
operacional, além do primeiro lucro líquido desde sua fundação em
2012.
Há também situações inversas. Um exemplo é a Pixeon, empresa que
recebeu R$ 76 milhões da Riverwood a partir de 2013. A cia. já era
lucrativa, mas com a entrada do fundo de PE, aumentou seus custos
e despesas operacionais até 2016 visando crescimento orgânico e
via aquisições. Com isso chegou a apresentar prejuízo operacional
em 2014 ampliando-o para R$ 5 milhões negativos em 2015. A
aposta deu resultado. A cia. cresceu 3,5x no período de 4 anos findo
2016, atingindo R$ 58,3 milhões de faturamento líquido, com lucro
operacional positivo e lucro líquido de R$ 3,6 milhões.
Quanto ao crescimento, essas empresas tiveram um crescimento
mediano de 2,2x no período compreendido entre o ano anterior à
entrada do fundo de PE (Ano -1) e o ano subsequente ao do investimento (Ano +1). O menor crescimento observado foi da ordem de
30% em dois anos.
Performance
Por se tratar de investimentos de PE em empresas com elevado
potencial de crescimento e também por se tratar de uma nova via de
saída para os fundos de VC, é de se esperar que haja um impacto no
desempenho de ambos os lados, tanto do PE quanto do VC.
As tabelas a seguir apresentam o desempenho de fundos de VC
(tanto fundos com diversas empresas como club deals envolvendo
apenas uma única start-up) em moeda local (R$). Vale ressaltar que
alguns fundos cobram taxas de administração e desempenho no
Brasil e outros no exterior. Para fins comparativos, o desempenho foi
analisado em termos brutos. Isso significa que as taxas cobradas no
Brasil foram somadas de volta ao fluxo de caixa para permitir
comparabilidade. Além disso, para fundos globais ou multi-regionais,
apenas a proporção investida no Brasil foi incluída na análise.
As perguntas que se buscou responder foram: fundos de VC que
apostaram em companhias que posteriormente receberam PE
tiveram resultado acima do mercado? Fundos de PE que investiram
nessas start-ups também tiveram resultados superiores?
Conforme a Tabela 2, os fundos de VC que apostaram nessas
empresas, em média, obtiveram um retorno significativamente maior
(alpha de aproximadamente 18%) comparados à mediana do
mercado em suas respectivas safras (data do primeiro aporte dos
quotistas no fundo).
Dentre os fundos analisados, 68% apresentaram retornos acima do
mercado. Agrupando-os por safra e calculando a mediana de
retornos, em apenas duas das safras estudadas, os fundos tiveram
desempenho inferior ao mercado: em 1999 e 2011.
Tendência similar ocorreu entre os fundos de Private Equity que
realizaram investimento nestas companhias. A Tabela 3 apresenta
análise análoga à anterior, porém aplicada ao mercado de Private
Equity. Neste cenário os fundos, em média, obtiveram um retorno
9% acima da mediana do mercado em suas respectivas safras. Ao
todo, 65% dos fundos analisados performaram acima do mercado.
Mas nesse caso, em quatro das dez safras analisadas o desepenho
mediano ficou inferior ao mercado: 1996, 2012, 2013 e 2015.
Os dados expostos acima sugerem que a integração entre estes
players tem sido especialmente benéfica para os fundos de VC, que
agora se deparam com mais investidores interessados em suas
empresas investidas e, portanto, com mais alternativas de liquidez e
valorização. Mas os dados também sugerem, que os fundos de PE
também estejam colhendo benefícios de apostar nessas empresas,
embora o efetivo resultado levará mais tempo para aparecer, em
especial considerando se tratar de uma prática que se ampliou muito
nos últimos cinco anos, período ainda curto no horizonte de
investimentos de fundos de PE.
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